- 30 de julho de 2018
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Estado brasileiro arrecada de modo injusto e gasta sem eficiência; tais distorções devem ser atacadas na tarefa urgente de reequilibrar suas finanças
À direita ou à esquerda, não há debate eleitoral relevante que não envolva ou ao menos tangencie a reforma do Estado —ou, vale dizer, a rediscussão das prioridades do poder público e de como devem ser financiadas suas tarefas.
Dos que apontam o gigantismo da máquina governamental brasileira aos que se afligem com sua ineficácia no combate à pobreza e à desigualdade social, são generalizadas as propostas de mudança no arranjo de receitas e despesas.
A Folha pretende aproveitar o período eleitoral e expor neste espaço sua visão sobre os temas mais cruciais para os próximos governantes e legisladores. No contexto nacional, o papel do Estado figura no alto dessa lista.
Trata-se, afinal, de uma estrutura que consome em impostos um terço do Produto Interno Bruto, ou seja, da renda do país, fatia exagerada para os padrões emergentes. Nem todos os recursos, porém, bastam para seus dispêndios, o que resulta em endividamento crescente a sufocar toda a economia.
Na formação desse Leviatã disfuncional está um acúmulo de eras geológicas, diz uma crítica comum. Isto é, são órgãos, funções, políticas e despesas de muitas décadas sedimentadas umas sob as outras, sem que o entulho de decrepitudes, ineficiências e interesses particulares seja removido.
Daí que se lance a bandeira de uma reforma radical, uma refundação. Mudanças de tal amplitude, porém, costumam ocorrer apenas sob ditaduras, ou ao final destas.
Mesmo a Constituição de 1988 teve resultados ambíguos, preservando muito de vícios antigos e introduzindo novos. Note-se que até alterações percebidas como urgentes nos sistemas tributário e previdenciário têm sido adiadas nos últimos 30 anos.
Em resumo, pode-se dizer que a máquina estatal arrecada de forma injusta e daninha, enquanto gasta de modo perdulário e ineficiente.
Nem se fala aqui, por ora, da corrupção que motiva escândalos em escala inédita nos últimos anos. Se o combate aos desvios é imperativo, cumpre desmontar o mito de que seja o bastante para reequilibrar as finanças e promover políticas bem-sucedidas.
Não sendo realista esperar um redesenho completo do setor público, por onde começar a ajustá-lo?
A derrocada orçamentária dos últimos anos tornou a resposta mais simples: não haverá governo viável sem que sejam enfrentadas as pressões por expansão de despesas, em particular com aposentadorias e pensões por morte.
Os pagamentos correspondem hoje a 13% do PIB nos três níveis de governo, segundo dados oficiais; se nada for feito, o percentual crescerá com o envelhecimento populacional e tomará o espaço de saúde, educação, segurança e outros setores prioritários.
O esforço de contenção de dispêndios passa também pela austeridade nas contratações e salários do funcionalismo, cujos privilégios já oneram em demasia os caixas de União, estados e municípios.
Tanto quanto possível, o ajuste das finanças públicas deve se dar pelo controle da despesa, não pela alta da receita, uma vez que a carga tributária já se mostra excessiva.
Entretanto é necessária uma revisão da miríade de benefícios tributários concedidos aos mais variáveis setores, em geral sem avaliação de objetivos e resultados nem prazo para cessação.
Essa tarefa precisa se pautar pela busca de simplicidade e equidade; o mesmo deve ser atingido em uma reforma mais ampla do sistema de impostos, taxas e contribuições.
A tributação brasileira é confusa, injusta, ineficaz e repleta de favores setoriais e regionais. Com grande peso sobre o consumo, prejudica sobremaneira os mais pobres. Regalias e proteções diferenciadas distorcem custos de produção e, pois, a decisão de aplicar de modo eficiente o capital escasso.
Há que trabalhar pela redução do número e do peso dos tributos indiretos, embutidos nos preços das mercadorias e serviços. A taxação deve seguir regras uniformes. Subsídios, se de fato necessários, precisam constar do Orçamento, com começo, meio, fim e avaliação.
Não se desconhece que a agenda aqui delineada, embora não dê conta de todas as deficiências estatais, demanda um esforço político quase revolucionário, dado o conservadorismo do ambiente brasileiro. Seu sucesso será menos plausível caso não se tome o cuidado de sequenciar as medidas.
As chances de levá-las adiante, contra resistências de partidos, corporações e lobbies empresariais, residem na mais indiscutível necessidade. Esgotou-se o tempo em que o crescimento do PIB e da arrecadação mascarava os vícios e as distorções da máquina.
É fato que as condições para as mudanças serão mais favoráveis com uma retomada econômica. Esta, por sua vez, dependerá da confiança de empresários e consumidores no conserto do Estado. Trata-se de equação complexa que consumirá boa parte do capital político do próximo governo.
Diretrizes para um Estado mais justo, eficiente e equilibrado
- Conter a escalada das despesas com aposentadorias e pensões
- Eliminar privilégios do funcionalismo, com redução do alcance da estabilidade
- Rever benefícios tributários concedidos ao setor privado
- Promover taxação mais progressiva sobre a renda e o patrimônio
- Simplificar os tributos incidentes sobre bens e serviços
- Instituir políticas públicas baseadas em metas de resultados, não de gastos
- Retomar a venda de estatais, associada a investimentos e competição
Fonte: Folha de S.Paulo.